Pioneiro
no Brasil, um estudo internacional indicou que o clima afeta a saúde das
crianças e que a vulnerabilidade muda de acordo com a faixa etária na infância.
Os resultados apontaram que bebês em período neonatal (7 a 27 dias) são os mais
afetados pelo frio, com risco 364% maior de morrer em condições extremas, em
comparação às condições normais. Com relação ao calor, o impacto cresce à
medida que a criança envelhece, sendo 85% maior entre 1 e 4 anos. A análise
abrangeu mais de 1 milhão de mortes de menores de 5 anos ao longo de 20 anos e
o risco de mortalidade nesta faixa etária chegou a ser 95% maior no frio
extremo e 29% maior no calor extremo do que em dias com temperatura amena (em
torno de 14 a 21°C, a depender da região). O estudo identificou ainda que o
risco apresentou variações regionais, por idade e causas específicas.
Conduzida
por cientistas do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde
(Cidacs/Fiocruz Bahia), do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da Universidade
Federal da Bahia (UFBA), da London School e do Instituto de Saúde Global de
Barcelona, a pesquisa foi publicada no periódico Environmental
Research. Líder do estudo, o professor do ISC/UFBA e colaborador do
Cidacs, Ismael Silveira, aponta que a sugestão de que crianças pequenas são
mais vulneráveis ao clima extremo já havia sido indicada por pesquisas
internacionais, no entanto, havia poucas evidências em países com clima
tropical e que fossem em escala nacional. “O Brasil tem dimensões continentais
e forte desigualdade socioeconômica, o que o torna um ‘laboratório natural’
para investigar os impactos do clima. A cobertura e qualidade dos dados de óbitos
e o uso de métodos estatísticos robustos favoreceram a superação dessa lacuna”,
pontua.
De
acordo com o pesquisador, crianças são especialmente vulneráveis aos efeitos
das mudanças de temperatura. Como seus corpos ainda não desenvolveram
totalmente os mecanismos de regulação térmica, elas têm mais dificuldade em se
adaptar tanto ao calor quanto ao frio. Essa combinação de fatores explica por
que eventos climáticos extremos costumam ter um impacto mais severo na saúde
infantil. Nos dias mais quentes, os riscos vão além do desconforto. Casos de
insolação, desidratação e até problemas renais podem surgir, além do aumento de
doenças respiratórias e infecciosas. O frio, por sua vez, acende outros
alertas. Baixas temperaturas podem levar à hipotermia, que desencadeia
complicações respiratórias e metabólicas, e ainda favorece o aumento de
infecções.
“Tanto
o frio quanto o calor estavam associados à maior mortalidade por todas as
doenças infecciosas, e especialmente por diarreia, enquanto a mortalidade por
doenças respiratórias estava associada apenas ao calor”, destaca Ismael.
Para
análise, os pesquisadores analisaram dados de mortalidade infantil de todos os
5.570 municípios brasileiros e cruzaram com informações diárias de temperatura
entre 2000 e 2019. O método permitiu comparar as condições climáticas
exatamente nos dias de morte das crianças e em dias próximos, mostrando de
forma precisa o efeito imediato do calor e do frio sobre a saúde infantil. A
pesquisa teve como base os dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade
(SIM) do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Conjunto de Dados Meteorológicos
Diários em Grade do Brasil (BR-DWGD).
Variações
regionais
“Embora
o estudo seja nacional, os resultados mostram grandes desigualdades regionais
que podem ser de diferenças climáticas, sociais, de infraestrutura e de acesso
à saúde”, observa Ismael. O estudo indicou que a Região Sul apresentou um maior
risco de mortalidade associado ao frio e a Região Nordeste um maior risco
associado ao calor. Nos achados, a mortalidade de crianças menores de cinco
anos relacionada ao frio atingiu o maior aumento (117%) no Sul, já a
mortalidade relacionada ao calor foi maior no Nordeste (102%).
As
taxas elevadas de mortes de crianças permanecem concentradas nas regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste, áreas onde a vulnerabilidade socioeconômica é maior e
o acesso à infraestrutura básica, como saneamento e moradia adequada, segue
desigual. Nesse contexto, o aumento das temperaturas representa uma ameaça
adicional.
“A
mortalidade infantil é altamente sensível a fatores ambientais e pode ser um
importante indicador das vulnerabilidades climáticas do país. Investir em
monitoramento climático e epidemiológico é fundamental para proteger a saúde
das próximas gerações”, afirma o pesquisador.
Mortalidade
como indicador de vulnerabilidades climáticas
De
acordo com dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a taxa
global de mortalidade de menores de cinco anos caiu 61% (em 1990, foram 94
mortes por 1 mil nascidos; em 2023, 37). No Brasil, houve a queda de 4,4% ao
ano na mortalidade infantil desde 2000, segundo dados do Painel de
Monitoramento da Mortalidade Infantil e Fetal do Ministério da Saúde (MS). No
entanto, as mudanças climáticas ameaçam essas quedas.
“Os
achados trouxeram uma importante evidência científica para políticas públicas,
mostrando que o clima já tem impacto mensurável na saúde infantil, reforçando a
necessidade de ações de adaptação às mudanças climáticas para proteger os
grupos mais vulneráveis”, conclui Ismael.
Fonte _ FioCruz
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