Em
agosto de 2025, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) emitiu alerta após
constatar um aumento de 34 vezes no número de casos de sarampo em relação a
2024. Dez países das Américas registraram ocorrências da doença, somando mais
de 10 mil confirmações e 18 mortes. Os óbitos se concentram no México (14), nos
Estados Unidos (3) e no Canadá (1). No Brasil, os registros mais recentes
apontam 24 ocorrências até o final de agosto, 19 delas no Tocantins. Embora o
país esteja entre aqueles com menor número de casos na região, permanece em
estado de atenção diante da alta transmissibilidade do vírus.
Altamente
contagioso, o sarampo se espalha pelo ar por meio de secreções de indivíduos
infectados e pode infectar pessoas de todas as idades. Os sintomas incluem
febre alta, erupção cutânea que se dissemina por todo o corpo, congestão nasal
e irritação ocular. A doença pode evoluir para complicações graves, como
pneumonia, encefalite, diarreia intensa e até cegueira, sobretudo em crianças
desnutridas e pessoas com imunidade comprometida. O Brasil havia recebido o
certificado de eliminação do sarampo endêmico em 2016 e, após enfrentar
reintroduções, recuperou o status em 2024.
Para
a chefe do Laboratório de Vírus Respiratórios, Exantemáticos, Enterovírus e
Emergências Virais do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Marilda Siqueira, é
urgente elevar as coberturas vacinais. “O sarampo é altamente transmissível.
Precisamos atingir, no mínimo, 95% de cobertura vacinal para criarmos uma
proteção coletiva na sociedade, reduzindo, assim, a quantidade de pessoas
suscetíveis ao vírus”, alerta.
Na
linguagem epidemiológica, "suscetíveis" são aqueles que não possuem
proteção contra determinado microrganismo. No caso do sarampo, seja porque
nunca foram vacinadas, porque não completaram o esquema de duas doses ou porque
não tiveram contato prévio com o vírus. Quando esse grupo cresce de forma
acumulada ao longo dos anos, forma-se um "bolsão de suscetíveis", ou
seja, uma concentração de indivíduos desprotegidos que facilita a circulação do
vírus e amplia o risco de surtos.
Vacina
é a solução
Até
o início da década de 1990, o sarampo era uma das principais causas de
mortalidade infantil no mundo, provocando cerca de 2,5 milhões de óbitos por
ano, em sua maioria entre crianças. A cobertura vacinal mudou esse cenário,
permitindo que países reduzissem progressivamente os casos e alcançassem a
eliminação da circulação endêmica em diversas regiões. Nas Américas, o feito
foi reconhecido em 2016, quando o continente recebeu o certificado oficial de
eliminação da doença.
No
entanto, essa conquista não significa que o vírus tenha desaparecido. O risco
de reintrodução é constante, sobretudo em contextos de baixa cobertura vacinal.
Segundo a Opas, a maioria dos casos registrados em 2025 nas Américas ocorreu
justamente entre pessoas não vacinadas, enquanto outra parcela significativa
envolveu indivíduos com situação vacinal desconhecida.
A
proteção contra o sarampo depende da aplicação de duas doses da vacina. No
Brasil, a vacinação regular prevê a primeira aos 12 meses e a segunda aos 15
meses de idade, podendo incluir outras faixas etárias em campanhas específicas.
“As crianças que não têm as duas doses registradas na caderneta não estão
totalmente protegidas”, ratifica Marilda Siqueira, destacando que a adesão ao
calendário vacinal é essencial para impedir o retorno do sarampo.
Segundo
a Opas, a cobertura nas Américas ainda não atingiu os 95% recomendados para
bloquear a propagação do vírus. Em 2024, apenas 89% receberam a primeira dose
da vacina tríplice viral e somente 79% completaram a segunda.
No
Brasil, a situação é mais favorável em comparação à média continental. Após
anos de queda, a cobertura vacinal voltou a crescer a partir de 2023, com
resultados expressivos em 2024. Segundo o Ministério da Saúde, o número de
municípios que atingiram a meta de 95% de imunização contra o sarampo, caxumba
e rubéola na segunda dose da tríplice viral mais que dobrou em dois anos,
passando de 855 em 2022 para 2.408 em 2024.
Em
2025, diante do aumento de casos em países vizinhos, o Brasil vem reforçando
suas ações de imunização, tanto em áreas de fronteira quanto em todo o
território nacional. No Sul, a reativação da Comissão Binacional de Saúde com o
Uruguai resultou em uma grande mobilização conjunta em Sant’Ana do Livramento,
no Rio Grande do Sul, e Rivera, no Uruguai, ampliando a proteção de moradores
locais e imigrantes.
Além
disso, o Ministério da Saúde tem promovido sucessivos Dias D de vacinação
contra o sarampo em diferentes estados. Em julho, a mobilização ocorreu em
cidades de fronteira do Acre, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rondônia, com
cerca de 3 mil doses aplicadas. Já em agosto, todos os 79 municípios de Mato
Grosso do Sul participaram da campanha.
Marilda reforça, no entanto, que nenhuma estratégia terá efeito se a população
não fizer a sua parte. “Em conjunto com secretarias estaduais e municipais, o
Ministério da Saúde está atuando nos municípios com casos confirmados para
evitar a disseminação do vírus. Mas esse trabalho só terá sucesso se contar com
a participação da população. Isso significa procurar o serviço de saúde ao
apresentar febre com exantema — aquelas manchas vermelhas pelo corpo — e manter
a vacinação em dia”, completa.
Não
é coisa de criança
O
sarampo ainda é visto por muitos como uma "doença da infância". Para
Marilda Siqueira, essa percepção se formou antes da vacinação em massa, quando
a infecção era mais frequente entre crianças e parecia menos grave em países
ricos, onde havia melhor nutrição e acesso à saúde. Essa leitura, no entanto,
pode ser perigosa. “A ideia de que é uma doença da infância é equivocada: o
sarampo pode afetar qualquer faixa etária e provocar complicações sérias,
inclusive mortes”, alerta.
Os
dados recentes da Opas reforçam essa avaliação. No México, a maioria das mortes
registradas em 2025 ocorreu entre pessoas indígenas com idades entre 1 e 54
anos, mostrando que a doença não se restringe aos mais novos.
Isso
significa que, embora crianças demandem atenção especial por serem mais
vulneráveis, nenhuma idade está livre dos riscos. A vacinação em todas as
faixas etárias continua sendo a forma mais segura e eficaz de evitar
complicações e impedir a volta da doença.
Fonte _ FioCruz

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