Ainda
que o número de infecções por Covid-19 continue aumentando e pressões
evolutivas levem ao surgimento de novas variantes do SARS-CoV-2, não devemos
ter um aumento expressivo de óbitos porque a vacinação completa vem impedindo o
agravamento da doença para internações e mortes. Essa é a opinião do presidente
do Instituto Butantan, Dimas Covas, para quem os imunizantes atualmente em uso
no Brasil têm oferecido proteção inclusive contra a variante ômicron do
SARS-CoV-2, cepa predominante no mundo e que tem dado origem a diferentes
sublinhagens.
“A
pandemia está crescendo. Em um ritmo lento, mas está. Isso não significa que
vamos ter aumento de óbitos. O que estamos observando é que, mesmo que aumentem
as infecções, em função da vacinação os casos são leves ou moderados”, explica
o médico hematologista, que também é professor da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. “Mas continuamos a ter óbitos e
internações, principalmente nas pessoas que não completaram o esquema vacinal
com terceira e quarta dose. Seria ilusório achar que a pandemia acabou.”
De
acordo com o Painel
Coronavírus do Ministério da Saúde, que utilizada dados do DataSUS, na 25ª
semana epidemiológica de 2022 (de 19 a 25/6) foram registrados 368.457 novos
casos de Covid-19 e 1.359 mortes. Já na 28ª semana epidemiológica de 2021 (11 a
17/7) haviam sido contabilizados 273.445 novos casos e 8.373 mortes. Isso
indica que, em julho de 2021, quando apenas 30 milhões de brasileiros haviam
completado o esquema primário de vacinação, a proporção era de 1 morte a cada
271 casos de Covid-19; atualmente, com 167 milhões de pessoas com as duas doses
ou dose única, a proporção é de 1 morte a cada 28 casos.
Pressão
evolutiva e escape vacinal
A
evolução de um vírus é aleatória: não há como prever de que forma ele vai
mutar. A ciência sabe, no entanto, que alguns elementos favorecem essa
evolução. Essas pressões evolucionárias, às quais todos os seres vivos e vírus
estão submetidos, dependem muito do ambiente em que o organismo está. “Essa
evolução de variantes era desconhecida, embora esperada, e o SARS-CoV-2
evoluiu”, resume o presidente do Butantan.
O
que não se previa, porém, era que houvesse uma evolução tão significativa no
transcurso de uma pandemia – ainda que algo semelhante tenha acontecido na
pandemia de gripe espanhola de 1918. Na época, o vírus causador da doença,
influenza A H1N1, mutou e deu origem a diferentes variantes no curso da
epidemia.
“Na
pandemia de Covid-19, tivemos a introdução das vacinas. As vacinas que foram
usadas, principalmente nos países desenvolvidos, agiam contra a proteína S
[Spike], um pedaço específico do vírus. Isso é pressão evolutiva: seleciona
naturalmente os vírus que acumulam mutações nessa proteína”, explica Dimas.
Isso propiciou, no início, uma evolução em busca do escape vacinal – ainda que,
na prática, a vacinação em larga escala tenha se revelado capaz de conter o
avanço no número de mortes por Covid-19. “Esse é o panorama geral: tem as
pressões seletivas e o vírus vai sendo selecionado à medida que a própria
pandemia avança.”
Em
um cenário de mutação do SARS-CoV-2, a CoronaVac, vacina de vírus inativado do
Butantan e da farmacêutica chinesa Sinovac, está mais preparada para oferecer
proteção, já que, em sua composição, contém o vírus inteiro. As vacinas que
focam na proteína Spike são monoantigênicas, enquanto vacinas como a CoronaVac
são poliantigênicas. “Elas resistem mais ao aparecimento de variantes, à
seleção de variantes.”
Variantes,
subllinhagens e vigilância genômica
Quanto
mais um vírus circula em uma comunidade, mais rápida é a infecção por esse
vírus e maior a possibilidade de ocorrerem mutações e surgirem novas variantes,
que são aleatórias. Se, por outro lado, uma variante se dissemina com uma
velocidade menor, ela leva mais tempo para atingir toda a população e demora
mais para sofrer novas mutações. Foi nesse contexto que, em 2020 e início de
2021, muitas pessoas que ainda não tinham a imunidade estabelecida pela vacina
foram infectadas pelas cepas delta e gama.
E
então veio a ômicron, uma variante muito diferente de todas as que a
antecederam e que causou a quarta e a quinta ondas de Covid-19 no Brasil e no
mundo. Ela rapidamente se propagou por todo o mundo, tornando-se dominante e
dando origem a sublinhagens, variantes muito semelhantes às linhagens das quais
provêm. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a ômicron e suas sublinhagens
são a única variante de preocupação (VOC, na sigla em inglês) do SARS-CoV-2
atualmente em circulação.
“Estamos
vendo evolução dentro da ômicron. Começou com a BA.1, hoje na Europa já foi
tudo BA.2 e agora rapidamente passando para BA.4 e BA.5, variantes de disseminação
muito rápida. No Brasil a BA.1 atingiu mais de 70% dos casos e a BA.2 subiu com
velocidade. Agora a BA.4 e BA.5 também crescem rapidamente. Isso explica a
tendência do número de casos e de internações nas últimas semanas”, explica
Dimas. Segundo a Rede Genômica Fiocruz, coordenada pela Fundação Oswaldo Cruz,
o processo de substituição da linhagem BA.1 pela BA.2 já está consolidado, e a
BA.2 atualmente responde pela maioria das amostras analisadas pela
instituição.
Números
da Rede de
Alerta das Variantes do SARS-CoV-2, coordenada pelo Instituto Butantan,
mostram que desde o início de fevereiro a variante ômicron é a única
identificada em todas as amostras analisadas do estado de São Paulo. Na 23ª
semana epidemiológica (5 a 11/6), a Rede registrou um aumento de 22,05% na
participação da variante BA.2 e suas sublinhagens em relação à semana anterior.
Além disso, a tendência da ômicron de dar origem a sublinhagens vem sendo
detectada há tempos pela Rede de Alerta. Entre maio e junho, algumas das
sublinhagens registradas no estado de São Paulo foram BA.2.5, BA.2.9.2, XAG
(primeira recombinante brasileira da ômicron, recombinação das linhagens BA.1 e
BA.2), BA.2.7, BA.2.11, BA.2.13, BA.2.31, BA.2.36, BA.2.37, BA.5.1 e XM
(recombinante entre BA.1.1 e BA.2). Em junho, a BA.4 e a BA.5 já representam
mais de 15% das amostras sequenciadas.
Quando
uma nova sublinhagem é detectada, os cientistas observam seus impactos em
termos de gravidade da doença. Se o efeito for pequeno, a tendência é que a
variante se dissemine e depois diminua sua participação. “Nós aprendemos a cada
dia, a cada semana. A vigilância genômica é importante e o Butantan tem feito
isso há algum tempo exatamente no sentido de permitir a identificação de
variantes novas e a porcentagem delas na população”, conta Dimas.
Fonte_BUTANTAN
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