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sábado, 25 de abril de 2020

Alto Risco: Jaleco vai de hospital às ruas


Cena comum em Belém, principalmente perto dos hospitais, é a de profissionais de saúde transitando com jalecos, máscaras e gorros. Muitos saem dos hospitais com o traje que usam dentro dos hospitais e vão comprar alimentos. Para a chefe da Divisão de Vigilância Sanitária da Sesma, Mara Hermes, o desrespeito no uso do jaleco é provocado pelo próprio profissional. “Ele tem a consciência sobre a questão da higiene ou pelo menos deveria ter. Acredito que ele está colaborando para uma provável infecção cruzada ou levar bactérias, se ele usar o jaleco dentro do hospital e ficar saindo dele”, diz.
A enfermeira da Sesma Valdirene Miranda afirma que a atitude não é recomendável. “Não tem nenhuma legislação ainda que normatize esse cuidado com a rouparia que os médicos usam dentro do ambiente hospitalar. Têm algumas legislações em municípios de São Paulo que já preconizaram que não se deve sair com as roupas. Nenhum município do Estado tem, nem a própria Sespa”, reitera.

O técnico do Departamento de Vigilância Sanitária da Sespa Cleber Monteiro avalia que alguns cuidados podem evitar o trânsito de micro-organismos e, consequentemente, a infecção hospitalar. “Não entrar com alimentos, evitar sentar na cama do paciente e fazer uma esterilização correta que, a meu ver, são a alma do serviço de saúde. Você evita agravos na saúde, se obedecer os protocolos de saúde do Ministério por meio da Anvisa”, afirma. E acrescenta: “Você não tem ideia do que uma mão pode transmitir de contaminação”.
No último final de semana, em Belém, os pais de uma recém-nascida que morreu em um hospital particular disseram que enfermeiras e auxiliares, responsáveis pela menina, não tinham nenhum tipo de cuidado. “Não usavam luvas, nenhuma proteção, saíam do banheiro e vinham pegar na menina. E a médica não aparecia”, disse um dos pais.

A inadequada higienização das mãos, o uso irracional de antibióticos e a falha no processo de esterilização dos instrumentos cirúrgicos são as principais causas de infecções hospitalares no Estado do Pará. De 397.570 pacientes que tiveram alta dos hospitais públicos e privados distribuídos nos 13 centros regionais de saúde do Pará, no ano passado, 8.150 tiveram alguma infecção hospitalar. Esse número de pacientes correspondeu, no global, a 2,05% do total de casos. O índice está abaixo do preconizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é de 5%. A OMS no Brasil é representada pelo escritório regional da Organização Pan-Americana de Saúde.
Infecção mais frequente é no pulmão
É considerada infecção hospitalar pela OMS a adquirida durante a internação hospitalar e geralmente provocada pela própria flora bacteriana humana, que se desequilibra com os mecanismos de defesa anti-infecciosa em decorrência da doença, de procedimentos invasivos – soros, catéteres e cirurgias – e do contato com a flora hospitalar. Atualmente, a terminologia mais correta para o termo é Infecção Relacionada à Assistência à Saúde (Iras).

Ainda com base nos dados do Departamento de Vigilância Sanitária da Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa), a maioria das infecções adquiridas dentro dos hospitais no Estado foi relacionada ao trato respiratório (22,1%), à corrente sanguínea (20,9%) e ao trato urinário (16,1%). As infecções com menor incidência foram do trato gastrointestinal (4,4%) e do sítio cirúrgico (1%). Exatos 8,6% do total de casos foram de infecções relacionadas às partes moles e tecidos do corpo e 8% foram de várias outras doenças. Os dados são catalogados de acordo com categorias de doenças reunidas.
O 1º Centro Regional de Saúde (CRS) da Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa), que congrega os municípios da Região Metropolitana de Belém (RMB), com exceção de Santa Isabel do Pará, possui os maiores números de saídas de pacientes e de infecções hospitalares. Em 2010, foram registrados 6.174 casos de infecção hospitalar de 234.392 saídas. O índice de infecções corresponde, no total, a 2,6% dos casos, também abaixo do estipulado pela OMS.

Em Belém, a Divisão de Vigilância Sanitária das Condições do Exercício Profissional, ligada à Secretaria Municipal de Saúde (Sesma), catalogou mais de 5 mil casos de infecção hospital só no ano passado. No primeiro trimestre deste ano, foram 1.335 casos e 1.163 pessoas infectadas. “O número de casos é maior porque uma pessoa pode ter mais de uma infecção. Por isso, o número de casos é geralmente maior que o número de pessoas infectadas”, esclarece a enfermeira Valdirene Miranda, fiscal do setor de vigilância sanitária da Sesma.
No Estado, Sespa coleta e analisa dados
Com base nos dados na Sespa, dos 56 hospitais que integram o 1º CRS – Belém, apenas 53 tem a CCHI. Desse total, 32 enviaram regularmente o boletim, 21 foram irregulares, cinco estavam incorretos e três não repassaram o boletim epidemiológico no ano passado. A pior situação estava no 8º CRS – Breves, composto por Anajás, Breves, Curralinho, Portel, Melgaço, Bagre e Gurupá, que não tinha notificação alguma de hospital nem de CCIH, consequentemente, do boletim que informa a taxa de infecção hospitalar. No 2º CRS – Santa Isabel do Pará, formado por Acará, Bujarú, Colares, Concórdia do Pará, Santa Isabel do Pará, Santo Antônio do Tauá, São Caetano de Odivelas, Tomé-Açú e Vigia de Nazaré, dos dez hospitais, seis tem a CCIH. Entretanto, não houve notificação dos boletins epidemiológicos durante o ano de 2010.

Do total de 224 hospitais públicos e privados em todo o Estado, 147 tinham a CCIH em 2010. Seguem os números dos boletins: 57 enviaram regularmente, 88 foram irregulares, 37 boletins incorretos e 84 não repassaram o documento. A Sespa informou que os dados estão sendo coletados, atualizados e avaliados.
Lavagem das mãos é procedimento básico
A higienização das mãos deve preceder qualquer procedimento. A fiscal Valdirene Miranda ensina que o tempo de lavagem varia de acordo com o procedimento. Se for cirúrgico, tem um tempo maior de lavagem das mãos, que deve ser desde as polpas digitais dos dedos, passando pela unha até a altura do cotovelo. Quando procedimento for apenas um curativo, por exemplo, já não requer um tempo maior de lavagem. “A solução que for usada na lavagem, varia para cada setor, principalmente para as áreas críticas que as comissões devem estar atentas. A UTI é uma área crítica, o centro cirúrgico, a central de material de esterilização, enfermarias com pacientes queimados, transplantados ou imuno-deprimidos e berçário também são. Lavagem é com sabão líquido. Não pode ser sabão em barra, porque o índice de contaminação é grande e não tem eficácia”, explica.

O uso irracional de antibiótico também favorece a infecção hospitalar. “Quem padroniza é o infectologista com a comissão e o corpo clínico. Geralmente, antes da cirurgia, se faz a profilaxia com antibiótico. Não pode usar qualquer tipo. Tem que apresentar para comissão. Se usar toda essa terapêutica medicamentosa indevidamente, faz com que as bactérias fiquem resistentes”, esclarece.
Os instrumentos cirúrgicos devem ser esterilizados adequadamente. “Hoje, usam peróxido de hidrogênio, que é o mais moderno porque tem eficácia no processo em mais de 90%”, explica.

Comissão, obrigatória por lei, não está em todos os hospitais
De acordo com a Sesma, existem 51 hospitais públicos e privados em Belém e 41 deles possuem a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH). A fiscal Valdirene Miranda lembra que a obrigatoriedade da comissão é regulamentada pela Portaria nº 2.616/98 do Ministério da Saúde. Ela deve ser composta por médicos, enfermeiros, farmacêutico e diretores, que devem ser exclusivos e não podem clinicar enquanto membros da comissão. “A função dela é fazer a prevenção, controle e monitoramento para que não ultrapasse o limite de 5% (preconizado pela OMS). Não temos cobertura enquanto legislação para cobrar deles dos que a não tem. Alguns têm unidades que se reportam a uma central. Como não são consideradas unidades de internação, quando o paciente fica mais de 24 horas, e sim consideradas unidades ambulatoriais, porque ficam menos de 24 horas. Por isso, nem todos os hospitais tem as comissões”, explica.

O setor de vigilância sanitária da Sesma visita no mínimo duas vezes ao ano os hospitais que formalizam a CCIH. “Tudo na Vigilância Sanitária precisa ser comprovado. Estrutura física, uma infraestrutura com acesso à internet, apresentar ata de constituição para saber quando começaram, ata da última reunião, portaria interna e nominalmente quem faz parte dela e atribuição deles de designação. Todo o mês eles tem que enviar à Sesma o boletim epidemiológico de controle de infecção hospitalar, porque temos que passar para o Estado, que repassa à Anvisa”, completou.
A enfermeira Valdirene afirma que a comissão não exclusiva é o maior problema detectado nos hospitais. “Os membros executores, principalmente o enfermeiro, não é exclusivo daquela atividade. Ele faz assistência, está no bloco, assistindo cirurgia, esterilizando material. Se ele não é exclusivo, como fazer serviço bem feito? Batemos com os diretores para eles contratarem membros exclusivos para esses cargos”, ressalta. Mara Hermes, chefe da Divisão de Vigilância Sanitária, acrescenta que os boletins epidemiológicos, às vezes, não constam dados reais. “São forjados. Em muitos casos, fazem pela obrigatoriedade de enviar para a gente. Quando a equipe vai analisar, suspeita que aquilo seja forjado, não correspondendo com a realidade, e vai até lá”.

Dificuldade em preencher boletins mensais e calcular taxas
A maioria das dúvidas dos profissionais de saúde que integram as comissões está relacionada ao preenchimento dos boletins mensais e cálculos das taxas. Cleber Monteiro, técnico do Departamento de Vigilância Sanitária da Sespa, diz que os cálculos e preenchimento dos boletins dependem do tipo de infecção. “Ainda tem hospital que informa índice zero de infecção. Isso não existe, ou seja, ainda há desconhecimento pela equipe como avaliar as infecções. Quando isso acontece, chamamos e explicamos como se faz. A gente sabe que dificilmente um hospital não tem infecção, porque tem. Todos têm”, diz.

Ele lembra que os hospitais contratam serviços terceirizados para higienização ambiental. As comissões têm a função de monitorar os serviços prestados pelas empresas, assim como a esterilização dos instrumentos e superfícies. “Além da CCIH, existe uma coordenação, uma gerência de risco. Todos deveriam ter e alguns não têm. Elas (coordenações) balizam e avaliam se os serviços prestados pela empresas terceirizadas atendem o determinado pela legislação. As Vigilâncias municipais tem o papel importantíssimo de cobrar, de verificar os contratos e se atende às legislações. Uma coisa é ter o contrato escrito e a outra se está sendo cumprido, implantada (a comissão) e funcionando”, esclarece o técnico da Sespa.
Cleber lembra que a função do Estado é fazer o monitoramento, acompanhamento e capacitação dos profissionais. A intervenção só ocorre quando o município não tem condições de atender por falta de recursos humanos ou desconheça o procedimento. “Ele aciona a regional de saúde, que aciona o departamento para verificar no que pode ajudar o município a melhorar as condições para que tenha serviço de boa qualidade para população”, orienta.

Fonte_COFEN

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