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quarta-feira, 22 de abril de 2020

História dos profissionais de saúde que morreram na luta contra a Covid-19

Na linha de frente no combate ao novo coronavírus, profissionais de saúde são os heróis de jaleco, mas também estão entre as vítimas da doença no estado. São médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e maqueiros que, mais expostos à contaminação, acabam perdendo a vida para a Covid-19.
Com base em dados do Conselho Regional de Medicina do estado do Rio e do Conselho Federal de Enfermagem, o EXTRA conta a história de 11 deles.
O caso mais recente confirmado é do técnico de enfermagem Alex Sandro de Carvalho, de 39 anos e sem comorbidades, que estava internado com diagnóstico positivo para a Covid-19.
De acordo com dados da Secretaria Estadual de Saúde do Rio, atualmente há 1.043 profissionais de saúde da rede afastados por suspeita ou confirmação de contaminação pelo novo coronavírus. Esse número representa 5,4% dos profissionais que atuam nas emergências e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) do estado.
O Hospital estadual Getúlio Vargas, na Penha, é o que tem o maior número de profissionais afastados, 186. A secretaria, no entanto, não respondeu sobre o número de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem mortos pela Covid-19 no estado.

Jorge Alexandre de Oliveira Andrade, 45, técnico de enfermagem – A última vez que o técnico em enfermagem Jorge Alexandre de Oliveira Andrade, de 45 anos, encontrou seus quatro filhos foi no dia 27 de março, duas semanas antes de morrer de Covid-19. No período em que permaneceu internado num hospital particular em Campo Grande, na Zona Oeste do Rio, Jorge só falava com a família por vídeo chamada, pelo celular.
Até o dia 6, mesmo com diabetes, hipertensão e obesidade (comorbidades da Covid-19), Jorge seguiu sua rotina de trabalho normalmente no Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca, unidade de referência no tratamento da doença. Na semana seguinte, logo que foi diagnosticado com o coronavírus, o técnico em enfermagem já tinha metade do pulmão comprometido. No dia 13, sua morte foi confirmada.
Profissionais do Hospital Lourenço Jorge fizeram uma salva de palmas na porta da unidade em homenagem ao amigo no dia seguinte à morte. “Nosso amigo da enfermagem, sentiremos saudades. Que Deus conforte os corações em luto. Descanse em paz”, dizia um cartaz feito pela equipe do hospital.

Claudia Nogueira Cardoso, 56 anos, endocrinologista – Formada pela Faculdade de Medicina Souza Marques, aos 23 anos, a endocrinologista tinha um consultório particular na Barra da Tijuca e trabalhava em clínicas populares em Bangu, Campo Grande e Taquara. Segundo o Cremerj, Claudia era diabética e hipertensa. Seu irmão, o cirurgião dentista Claumyr Cardoso, afirma que no dia 1º de abril, a médica relatou à família que estava com sintomas de um resfriado, mas não parou de trabalhar e acabou falecendo no último dia 8:
—Chegamos a falar para ela redobrar os cuidados, mas ela disse que era um resfriado leve e que não poderia parar de trabalhar. No dia 6 de abril, o filho dela, que também é médico, fez uma visita e viu que a mãe não estava bem. Logo pela manhã, ela deu entrada no Hospital Casa São Bernardo, na Barra da Tijuca. Mas, de um dia para o outro, a situação se agravou muito: na manhã do dia 8, ela teve uma parada cardíaca e morreu.
Claumyr conta que a irmã tinha hipertensão e diabetes tipo 2 e que o marido dela, o dentista Jorge Carlos da Costa, também foi contaminado pela doença.
— Um dia depois da Claudia ser internada, o marido dela também foi. Ele chegou a ficar entubado, mas felizmente teve alta na última quinta-feira. Estamos muito abalados com tudo isso. Minha irmã exerceu o seu ofício até ser vencida pela doença — lamenta Claumyr que destacou ainda que Claudia era colunista de saúde da Rádio Tupi.

Ricardo Antonio Piacenso, 62, cardiologista – Formado pela Faculdade de Medicina Souza Marques, Ricardo se tornou avô de uma menina há cerca de quatro meses. Pai de dois filhos, ele estava internado no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, unidade de referência no combate ao coronavírus, em Acari. O médico morreu no dia 5 de abril, aos 62 anos.
Sua esposa, Rhosy Piacenso, lamentou o ocorrido por meio de uma rede social. Ela contou que perdeu o marido após uma relação de 34 anos e relembrou os momentos de companheirismo, cumplicidade e amor entre os dois.
— Ao acordar, sempre aquela mesa do café da manhã preparada para mim com carinho e quase sempre com vasinhos de flores. Nossa, toda vez que abro a porta de casa, para mim, você vai voltar a qualquer momento com aquela carinha de feliz em retornar para casa e ficarmos juntos — contou Rhosy, que concluiu a declaração: — Você sempre será nosso herói, onde em sua profissão de médico foi sempre responsável e sensível com a dor dos seus pacientes.

José Manoel de Melo Gomes, 64, anestesiologista – José Manoel de Melo Gomes, de 64 anos, era médico anestesiologista. Trabalhou a vida toda no Hospital Naval Marcílio Dias, no Lins, onde fez residência; e no Oeste Dor, em Campo Grande, bairro onde morava. Segundo o Cremerj, José Gomes, que morreu no último dia 5, era muito querido pelos colegas por sua excelência profissional e alegria.
Numa rede social, amigos lamentaram a morte do anestesiologista. Em uma das homenagens, uma colega de trabalho publicou “Hoje, o dia amanheceu triste! A Medicina e a Anestesia perdem um colega ímpar! José Manoel Melo Gomes, muito obrigada pelos ensinamentos em nossos plantões, pela paciência em nosso sistema falido e pela dedicação a todos os pacientes! Que Deus receba você de braços abertos, meu amigo! Você foi um guerreiro nesta luta!”.

João Batista Marangoni, 65, clínico geral e pediatra – Morador da Tijuca e médico há mais de 30 anos, João Batista Marangoni morreu de Covid-19 no último dia 9, deixando uma mulher e uma filha. Portador de mielodisplasia, trabalhava no sistema regulação de vagas do SUS e passou a apresentar sintomas que não são os mais comuns para a doença, como diarreia e fraqueza. A família decidiu não levá-lo imediatamente ao hospital justamente em razão dos sintomas não serem os mais recorrentes para Covid-19. Contudo, após não apresentar melhora, foi levado ao hospital da Unimed Barra da Tijuca, onde foi internado de imediato, como conta a filha Luisa Marangoni, de 29 anos:
— A gente não o levou para o hospital justamente porque os sintomas não eram de coronavírus, então tínhamos medo de que ele pudesse se contaminar. Ele só passou a sentir febre dias depois e passou duas semanas internado.
Katya Marangoni, viúva de João e mãe de Luisa, o descreveu como uma pessoa amável.
— Foi uma grande perda porque ele era um excelente pai, um excelente marido e excelente profissional. Já recebeu homenagens de colegas de trabalho e era muito querido pelos amigos — assegura.

Anita Souza Vianna, 63, técnica de enfermagem – A técnica de enfermagem Anita de Souza Vianna, de 63 anos, morreu na ultima quinta-feira (16), também em decorrência da covid-19. Ela trabalhava na linha de frente do combate ao coronavírus, no Hospital Ronaldo Gazolla. Após não conseguir um leito disponível onde trabalhava, foi transferida para o Hospital Estadual Zilda Arns, em Volta Redonda, onde ficou internada por quatro dias. Mas não resistiu, deixando três filhas e o marido.
Na sexta-feira, um dia após o óbito, uma das filhas da técnica publicou em suas redes sociais uma foto da mãe sorrindo, com a seguinte legenda: “É assim que vou lembrar de você…sempre com esse sorriso encantador. Mãe, para sempre vou te amar”. No sábado, dia seguinte, compartilhou uma imagem com os dizeres “A ignorância dura até você perder um familiar. Fica em casa. Mantenha o distanciamento social”.
Sobrinha da vítima, Luziney Reis afirma que Anita, que ficou internada entre os dias 13 e 16 no Zilda Arns, não tinha comorbidades preexistentes:
— Quando ela começou a sentir os sintomas da doença, foi ao (hospital) Gazolla, e simplesmente mandaram ela tomar dipirona e ir para a casa sem fazer o teste para identificar se era covid ou não. Ela era uma pessoa super querida e atenciosa com os pacientes, que sempre tinha uma palavra amiga para oferecer.

Cláudio Maurício Santana, 59, maqueiro – O maqueiro Cláudio Maurício Santana, de 59 anos, foi a vítima fatal mais recente dentre os profissionais de saúde do Rio. Há dez anos, ele atuava na UPA do Engenho Novo, na Zona Norte, e morreu na manhã da última sexta-feira (17) após oito dias de internação na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Estadual Zilda Arns, em Volta Redonda, único local onde encontrou vaga.
Cláudio não portava doenças preexistentes e estava afastado do trabalho desde seu último plantão, em 7 de abril, quando começou a demonstrar os primeiros sintomas da Covid-19. Ele foi colocado em quarentena por um médico da própria UPA mas, dois dias depois (9), retornou com sintomas mais graves da doença e foi encaminhado à unidade de Volta Redonda, onde faleceu.
Eliane Rodrigues era esposa de Cláudio e acredita que ele tenha sido contaminado no ambiente de trabalho. Eles já estavam juntos há mais de 40 anos e ele era uma pessoa querida por todo mundo, conta ela:
— Ele foi afastado do trabalho porque estava sentindo muita dor de cabeça e febre, que não passavam de jeito nenhum. Era uma pessoa brincalhona e festiva, querida por pelos amigos, familiares e colegas de trabalho, tanto que ele recebeu uma homenagem muito bonita pelos seus colegas da UPA quando se foi. Foi uma perda muito triste para todos — disse a viúva de 58 anos, moradora de Vila Isabel.
O enterro, realizado no Cemitério São Francisco de Paula, no Catumbi, contou apenas com a presença de familiares e de cinco colegas de trabalho da vítima.

Carla do Nascimento Dias, 46, técnica de enfermagem – Carla do Nascimento Dias era conhecida na Polícia Militar do Rio como um anjo da guarda dos policiais que chegavam feridos na Emergência do hospital da corporação. Foi no próprio Hospital Central da PM, onde a sargento e técnica em enfermagem trabalhava há duas décadas, que ela morreu no último dia 15, após um mês lutando contra a Covid-19.
Carla integrava o grupo de risco da doença: era diabética e hipertensa. Ela foi o primeiro caso confirmado de morte pelo coronavírus na PM. No entanto, Carla também se notabilizou por sua atuação em outro hospital, o Instituto Municipal Nise da Silveira, unidade de referência da rede de Saúde Mental do Rio. “Carla sempre demonstrou sua dedicação, com sorrisos, afeto e alegria, nos cuidados oferecidos aos pacientes”, diz a nota pela direção do hospital.
Nas redes sociais, colegas lembraram da atuação de Carla na unidade: “Perdemos uma parceira no cuidado. Nosso time está desfalcado pra sempre”, escreveu um médico do hospital. Carla deixa um companheiro e um filho de 13 anos.

Paulo Henrique Lima, 40, técnico de enfermagem – Paulo Henrique Lima, de 40 anos, trabalhava no centro cirúrgico do Hospital Federal de Bonsucesso, unidade de referência para o tratamento de coronavírus no Rio. Ele morreu no dia 9, após vários colegas desabafarem nas redes sociais sobre a falta de equipamentos de proteção na unidade. “Nas 12 primeiras horas de trabalho não cuidei de paciente. Cuidei de conseguir material para abastecer o setor. Quanta guerra enfrentei. Não havia capote e nem máscara para iniciar o plantão”, contou uma profissional.
A doença se alastrou rapidamente: Paulo Henrique foi internado no dia 6, uma segunda-feira, foi entubado três dias depois e faleceu na manhã de quinta-feira, dia 9. Na internet, amigos lamentaram a morte: “Homem bom, generoso, excelente profissional, divertido, sempre disposto a ajudar”.

Alex Sandro de Carvalho, 39, técnicos de enfermagem – Alex Sandro era técnico de enfermagem e agente comunitário de saúde há 17 anos. Ele também trabalhava na Unidade de Pronto Atendimento do Complexo de Gericinó,na Zona Oeste do Rio, onde se encontra a maior parte das unidades prisionais do estado. O profissional da saúde não tinha comorbidades e estava internado, lutando contra a Covid-19.
Uma amiga de trabalho fez uma postagem no Facebook lamentando a morte do técnico de enfermagem. “Quando os números se tornam rostos conhecidos é que a ficha começa a cair. Hoje sentimos a perda do nosso agente comunitário e técnico de enfermagem Alex. Foram dias de angústia e tentando fazer o possível e o impossível pelo nosso amigo. Ele sempre fazia além do seu trabalho e era querido por todos”, escreveu.

Evandro Barbosa, 45, enfermeiro – Enfermeiro e apaixonado por carnaval. Profissional de saúde no Hospital estadual Getúlio Vargas, na Penha, Zona Norte do Rio, Evandro Barbosa, de 45 anos, morador de Olaria, estava na linha de frente na luta contra o que há de pior nos efeitos da Covid-19 na sociedade quando acabou se tornando também vítima da doença.
De acordo com o relato de amigos e parentes, Evandro, que também atendia na UPA da Penha, foi internado na UTI do hospital onde ele trabalhava, no último dia 10 de abril. Dez dias depois, o enfermeiro e componente da Portela não resistiu neste domingo, e se tornou uma das 257 vítimas da doença na capital.
“A última lembrança sua foi em uma chamada de vídeo para minha mãe, você já estava passando mal, mas nos disse que era reação de uma vacina, suas palavras foram: ‘Não se desesperem, eu estou bem!’. Um ser humano incrível”, escreveu na página de Evandro uma amiga.
Fizemos o levantamento com base em dados do Cremerj e do Conselho Regional de enfermagem. Não temos informações sobre um morto: uma técnica de 66 anos do Hospital Municipal Darcy Vargas, em São Gonçalo.
Fonte_COFEN

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