Você sabe como é produzida a vacina contra o HPV, que protege contra diferentes
tipos de câncer? Ela é feita a partir de partículas semelhantes ao vírus (VLP,
do inglês virus like particles). Baseada em engenharia genética, a
tecnologia consiste em desenvolver uma molécula contendo a principal proteína
da superfície do vírus, a L1, mas sem o DNA viral que normalmente fica dentro
do vírus. A partícula criada em laboratório “imita” a estrutura do vírus,
fazendo o sistema imune acreditar que ela é uma ameaça. Por não conter o
material genético do patógeno, a estratégia é considerada extremamente
segura e sem risco de causar infecção.
“A
vantagem é que a VLP consegue entrar nas células como se fosse o vírus,
induzindo uma resposta celular elevada, além de induzir resposta humoral [de
anticorpos]. É um imunizante seguro inclusive para grupos vulneráveis, como
imunossuprimidos, já que é incapaz de se replicar e provocar doença”, explica a
diretora do Laboratório de Biotecnologia Viral do Butantan, Soraia Jorge, que
trabalha no desenvolvimento de VLPs contra o vírus da raiva, SARS-CoV-2 e zika.
O
imunizante utiliza essa plataforma porque as proteínas do HPV têm uma
característica específica: elas são capazes de se agrupar naturalmente em
partículas semelhantes ao vírus inteiro, quando expressas em diferentes
sistemas (como em bactérias ou leveduras, por exemplo). “A L1 é a maior
proteína estrutural do HPV e a mais prevalente na superfície, capaz de induzir
alta resposta imune. Por isso ela foi escolhida como antígeno para compor a
vacina”, diz a pesquisadora.
HPV pode causar 6 tipos de câncer; vacina é a forma mais segura
e eficaz de proteção
Diferente
de vírus como o SARS-CoV-2 e o influenza, o HPV é mais simples, com apenas duas
proteínas na superfície. Além disso, não possui envelope ao seu redor (membrana
de lipídios). De acordo com Soraia, o exterior do vírus é o próprio capsídeo,
uma espécie de “capa” de proteínas que envolve o material genético, facilitando
a construção de VLPs.
As
partículas semelhantes ao vírus podem ser produzidas com diferentes técnicas,
utilizando células de inseto, fungos ou bactérias para expressar as proteínas
virais. Outras vacinas que adotam essa plataforma são a da hepatite B, a
Flublok, imunizante tetravalente contra influenza da Sanofi, e a Mosquirix da
GSK, contra a malária.
E
não é só na imunização que essa tecnologia pode contribuir. De acordo com
uma revisão publicada recentemente na Frontiers in
Microbiology, estudos indicam que as VLPs podem ser usadas para auxiliar
no tratamento de doenças infecciosas como HIV, gripe, hepatite B,
malária, Ebola, Covid-19, zika, dengue, entre outras, por meio do
desenvolvimento de vacinas terapêuticas. Diferente dos profiláticos, que
previnem infecções, os imunizantes terapêuticos estimulam o sistema imune para
combater uma doença já instalada.
Outra vantagem de imunizantes baseados em VLP, segundo o artigo, é a facilidade de atualização contra novas cepas de vírus: elas podem ser preparadas dentro de 12 a 24 semanas após o sequenciamento de uma variante, enquanto as vacinas convencionais geralmente exigem 24 a 32 semanas para serem fabricadas.
A
técnica também tem sido empregada por meio de nanopartículas para entregar
medicamentos em locais específicos do corpo. Isso porque os fármacos
em geral costumam ter ação sistêmica, em todo o organismo, e um dos desafios da
ciência é encontrar formas de direcionar o tratamento para a região afetada.
Além
de VLPs, os imunizantes virais também podem ser atenuados, inativados, de
subunidade, de DNA ou de RNA mensageiro. Vale ressaltar que todas as
plataformas são seguras e validadas por ensaios clínicos e órgãos reguladores
antes de as vacinas chegarem à população. “São diferentes estratégias para
apresentar o antígeno à célula e induzir resposta imune. A plataforma escolhida
depende muito das características do vírus para o qual se quer desenvolver a
vacina”, destaca Soraia.
Fonte_BUTANTAN
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