Um
estudo conduzido por pesquisadores da Fiocruz, da London School of Hygiene and
Tropical Medicine, da Universidade de São Paulo (USP) e da Western University
(Canadá) revelou que quanto maior a privação socioeconômica de um município,
maior é o risco de natimortalidade, que é o falecimento do bebê antes do
nascimento a partir da 20ª semana de gestação. Os
achados apontam que gestantes que vivem em áreas mais vulneráveis
têm até 68% mais chances de perder o bebê antes ou durante o parto, em
comparação com as que vivem em regiões mais favorecidas.
Com
participação do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde
(Cidacs/Fiocruz Bahia), a pesquisa analisou nascimentos no Brasil entre 2000 e
2018, com base nos registros oficiais do Ministério da Saúde (MS) através do
Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) e Sistema de Informações
sobre Mortalidade (SIM).
“Sabemos
que há uma relação direta entre condições socioeconômicas, acesso inadequado
aos serviços de saúde materna e baixa qualidade do cuidado durante a gestação e
o parto”, explica pesquisadora do Cidacs/Fiocruz Bahia, Enny Paixão, que também
é professora associada da London School of Hygiene and Tropical Medicine e uma
das autoras do estudo. “Ainda não era claro exatamente quanto as condições
socioeconômicas de cada município influenciavam essas taxas, agora, as
evidências mostram claramente que essa diferença existe e tem impacto real nas
taxas de natimortalidade”.
A
pesquisadora também pontua que “investigar a natimortalidade entre municípios
segundo o nível de privação é fundamental para identificar áreas que demandam
melhorias no acesso e na qualidade da atenção perinatal”.
Mapa
da desigualdade perinatal
Os
pesquisadores utilizaram o Índice Brasileiro de Privação (IBP/Cidacs), que
considera renda, escolaridade e condições de moradia, para classificar os
municípios em níveis de privação material, também conhecida como níveis de
posição socioeconômica. O padrão encontrado apontou que quanto maior a
privação, maior o risco de o bebê não nascer com vida.
Em
2018, foram 28,6 mil natimortos no país, o equivalente a 9,6 por mil
nascimentos. Embora o número esteja dentro da meta global de até 12 por mil, o
dado esconde desigualdades. Nos municípios com melhores condições
socioeconômicas, a taxa foi de 7,5 por mil. Já nos mais privados
socioeconomicamente, chegou a 11,8 por mil.
Essa
disparidade se torna ainda mais evidente quando se foca em regiões com níveis
diferentes de realidade socioeconômica. A Região Nordeste, em 2012, apresentou
a maior taxa de 12,1 natimortos por mil nascimentos, enquanto o Sul apresentou
a menor prevalência, com 7,7 por mil nascimentos.
A
pesquisa também revelou que as desigualdades pouco mudaram nos últimos 18 anos.
Entre 2000 e 2018, a taxa nacional de natimortalidade caiu cerca de 1,1% ao
ano. Além disso, cerca de 90% (25.847) das mortes fetais ocorreram antes do
parto, o que, segundo os autores, pode indicar falhas no acompanhamento
pré-natal e no monitoramento da saúde da gestante.
As
mortes durante o parto, embora menos frequentes, representando 4,3% (1.229) dos
natimortos, também se concentraram nas áreas de maiores privações, onde faltam
infraestrutura hospitalar e profissionais qualificados.
“Já
era esperado pelos pesquisadores que encontrássemos taxas mais altas de óbitos
fetais nos municípios com maior privação. No entanto, vale destacar que, ao
longo dos anos, foram observadas melhorias gerais, com redução das taxas de
natimortalidade em quase todos os níveis de privação - exceto nos municípios
mais vulneráveis, onde as taxas não apresentam evidências de queda”, enfatiza
Paixão.
Desafio
começa antes da primeira respiração
Apesar
dos avanços na redução da mortalidade infantil e neonatal no Brasil, a
natimortalidade segue como um problema muitas vezes silencioso. Por não
envolver o registro de um nascimento com vida, o tema ainda recebe pouca
atenção, mesmo representando uma perda humana e emocional devastadora para as
famílias.
“Esses
resultados destacam as fortes desigualdades nas chances de natimortalidade em
todo o Brasil. São necessárias ações direcionadas para reduzir essas
disparidades”, Paixão destaca.
Algumas
das ações recomendadas são ampliar o acesso ao pré-natal, garantir
infraestrutura adequada nas maternidades e reduzir desigualdades regionais na
saúde perinatal. A pesquisadora completa que essas medidas devam ocorrer
“especialmente nos municípios mais privados, a fim de diminuir as taxas de
natimortalidade e melhorar a equidade em saúde perinatal”.
Fonte _ FioCruz
.jpeg)
Nenhum comentário:
Postar um comentário